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domingo, 17 de março de 2013

                 A menina e seu Pai


            A menina estava ali, paradinha,e  pensando:
- Nossa, como papai é quieto, quase não conversa e quando cumprimenta os outros na rua só faz um aceno com a cabeça ou quando vai dizer Bom dia!, Boa tarde! ou Boa noite! Só dizia: “Boooa!”. Algumas pessoas estranham isso. Porque eles dizem: “Onde se viu um homem tão calado no dia a dia, mas que sabe muito bem lutar pelo direito dos outros e  falar em  reuniões e comícios  para tratar de assuntos de interesse público ou de um grupo de pessoas?! Ah, como ele fala bonito... Ouvi dizer que ele conhece leis mais do que muitos advogados e a Bíblia Sagrada mais do que muitas pessoas religiosas.
            A menina era uma garota gordinha, de pele morena clara, estatura baixa e com cabelos negros, escorridos até a cintura, essa porém falava  bastante. Perguntava sobre tudo, era por que para lá e para cá. Eram tantos os porquês que algumas professoras diziam:
-          Cala a boca, menina, não atrapalhe a minha aula!
Outras:
-          Onde se viu perguntar tanta coisa? Isso é assim porque é assim, ora bolas!
-          Você deveria perguntar ao seu pai, já que diz que ele sabe tanto. 
Ela também sonhava mil coisas: sonhava com  um mundo belo, colorido, cheio de flores, pássaros, doces, crianças para brincarem com ela, muitos brinquedos e ruas para se divertirem,  pensamentos livres leves e soltos...  
Na escola, como já deu para perceber,  as professoras não tinham paciência com ela. Aliás, parece que não tinham com ninguém, não sei por que escolher uma profissão para trabalhar com crianças senão têm jeito para isso, não é mesmo?
O pai da menina sim, respondia tudo e a chamava de Emília, referindo-se à personagem da obra Sítio do Picapau Amarelo, pois além de curiosa, ela também era questionadora e pirracenta. Teimooosa... Quando não faziam o que ela queria, batia o pé e  ficava com um bico enorme.
Muitas vezes a menina pensava:
- Meu pai não  faz carinhos na gente como os outros , não beija, não abraça e nem sempre e, só algumas vezes, pega a gente no colo.
 Este, entretanto era de um coração tão bom que isto dava para compensar essas falhas, pois ele não brigava com ela e nem com o irmão, não batia e nem os deixava de castigo, talvez porque também não precisasse. Quando eles eram pequenos achavam que o pai deles era o tio e o tio era pai, pois este se ausentava muito do lar por causa do trabalho e para ir à reuniões políticas, só que eles ainda não entendiam isso. Um dia a menina e o irmão descobriram que o Papai Noel deles era o tio, aí que passaram a achar mesmo que ele fosse o pai, engraçado não é?
Algumas vezes, a menina queria fazer perguntas ao seu pai e acabava nem fazendo, pois via que ele estava muito atento à leitura de algum livro ou jornal. Pois o que ele gostava muito de fazer era de ler  para adquirir muitos conhecimentos sobre política, religião etc e também lia para a menina e seu irmão.
Sabem que antes mesmo do seu irmão mais velho nascer, seu pai já havia comprado toda coleção infantil do Monteiro Lobato, que seria do primeiro que nascesse. Como seu irmão teve a sorte de nascer primeiro ficou com ela. Ele também ensinava muitas coisas por meio de suas ações, pois estava sempre pronto para ajudar os outros, não matava bichos nem pequenos nem grandes. Mesmo que deitasse muito tarde não hesitava em levantar cedo para ir ao trabalho, era muito educado com as pessoas, até com aquelas que lhe tratassem mal, não dizia palavrões, respeitava as pessoas e as aceitava como eram e estava sempre disposto a perdoar as falhas alheias.
Um dia a menina perguntou:
-          Pai, por que você não mata cobras e nem outros bichinhos?
-          Porque são vidas, minha filha – respondeu-lhe o pai.
-          Ah.
Um dia, quando  a menina já estava com quase dez anos, recebeu uma notícia de sua mãe:
-Filha, você vai ganhar uma irmãzinha ou irmãozinho e ela ficou muito feliz, mas depois com um pouco de ciúmes, pois passou a receber menos atenção.
            ...
           
Quando a menina começou ir à escola foi um tormento para ela e para a família.
- Menina – dizia a professora – você precisa decorar as lições da cartilha!
Sua mãe também ficava brava.
E ela pensava:
Eu  não gosto disso, não tem graça esse monte de palavras sem nada a haver uma com outra. Eu quero coisa diferente.
Na verdade, ela queria  aprender a ler logo, mas  para ler a coleção do Monteiro Lobato e os livros que o pai dela lia, só não queria ler a cartilha. Ela não sabia explicar, mas ela achava muito chato tudo aquilo, como que podia aprender a ler umas coisas estranhas, ter que misturar bolas, com bois e barrigas? E ficava imaginando como seria escrever o nome de vários brinquedos,  bichos e coisas em momentos separados. O  pai até que entendia as razões da menina. O que ele não entendia é por que ela não gostava de estudar História do Brasil e a menina  também não sabia explicar que era porque a professora ensinava coisas diferentes das que ela lia nos livros do seu pai, os quais contavam Histórias verdadeiras.
            Ah, a menina também gostava muito de inventar histórias, inventava cada uma...
Um dia ela disse para mãe:
-          Mãe, minha amiga falou que a avó dela de setenta e dois anos teve um bebê!
De outra feita ela disse que ouviu no rádio que em algum lugar do mundo a temperatura tinha chegado a 100ºC.
Certa vez, ela até apanhou porque inventou uma história envolvendo professores e colegas e na sua casa todos acreditaram, mas quando seu pai descobriu a verdade deu uma surra nela, foi a segunda e última surra que ela levou dele. Mas ele não sabia que a menina, um dia, viria adorar inventar histórias e que não teria a mesma imaginação de quando era menor, pois ela ficou tão chateada que nunca mais mentiu e nem aceitava mentira de adultos. Então ficou mais difícil para ela inventar as histórias. Mas ela nunca deixou de tentar e adorava contar e ler histórias que achava nos livros.
Teve uma época que o pai dela ficou muito tempo longe de casa,  pois como ele lutava para todos terem direitos iguais, como moradia, estudo, alimentos etc, era mal visto pelas pessoas ambiciosas e exploradoras de pais de famílias, mães e crianças.  Foi nessa época que ela começou a  perceber o quanto ele era corajoso.
Depois de alguns anos ele foi preso, torturado pela polícia militar, pois naquela época (?!) era proibido dizer a verdade sobre o que acontecia de ruim no país, mas não denunciou nenhum companheiro e a menina começou a ver o pai como um herói, só que não podia comentar com os amiguinhos e nem com gente grande, bem lá  no fundo ela sabia que ele era um grande homem e queria mudar toda aquela História.
Quando ela já estava moça e se formou na oitava série, seu pai estava preso e ela disse-lhe:
-          Que pena, pai, você não poder ir na minha formatura.
Ele, então, respondeu:
- Quando você se formar no Ensino Médio, que naquela época era colegial, iremos nós cinco jantar fora.
Quando ela se terminou o segundo grau,  ele estava novamente preso. Apesar de chateada, ela compreendeu.
Ela só não conseguiu entender uma coisa:
-          Por que ele não veio na sua  festa da sua formatura do Curso Superior.?
Como ela já era adulta, acabou entendendo que.  às vezes, as pessoas assumem compromissos que não podem ser desmarcados ou por algum  motivo não se sentem dispostas.
Nessa época ela já era casada e mamãe de um casal de adolescentes e com o relacionamento conjugal em crise.
O que a menina-mulher achou bom mesmo, foi quando ela precisou se separar do marido e o seu pai deu a maior força, até pagou advogada para ela.
Um dia, ela resolveu que queria fazer especialização em Literatura Infanto-Juvenil e pensou:
-          Como fazer se não tenho dinheiro nem para pagar aluguel?
Comentou com o seu pai e ele disse para ela que escolhesse a faculdade e pagou-lhe o curso todo.
- Não acham que isso foi mesmo que foi incrível?!?!
Ah, o que seria dessa menina sem esse pai maravilhoso...?
Ah. Ela também tem mãe, viu? Que sempre foi muito preocupada e prestativa, pois quando menina nasceu tinha problema de saúde e se não fosse a mãe dela correr atrás de médicos e tratamentos, seria impossível a menina estar escrevendo isso hoje. Quando  o pai dela precisava fugir do exército ou ia preso, quem cuidava de tudo no lar era a sua mãe e também e se alguém falasse mal de seu pai,  ela era a primeira a defender o marido, embora não entendesse bem porque ele se sacrificava tanto pelos outros.
Hoje esta menina já uma senhora, é professora de Língua Portuguesa e procura dar aulas dinâmicas, com  conteúdos necessários para que seus alunos construam seus conhecimentos, mas que os agradem. e o preparem para a vida.
 O  seu pai? Bem, o seu pai continuou na luta por um mundo melhor e a ajudá-la sempre que possível e necessário.

            

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